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sexta-feira, 20 de fevereiro de 2009

O dever de dizer não?

Por: Maurício Rands*

No presente, a oposição está praticamente sem projeto alternativo. Confunde o dever de fiscalizar com a quase obrigação de obstruir

O presidencialismo de coalizão hoje em vigor no Brasil levou parte da literatura especializada (Lamounier, Abranches) a considerar que as nossas instituições políticas seriam tão complexas, desarticuladas e centrífugas que sofreriam de uma "síndrome da paralisia hiperativa". Verificando que, apesar do aparente caos, nossas instituições têm conseguido produzir resultados, uma outra parte da literatura (Figueiredo & Limongi, Desposato) tem mostrado que outros fatores, além dos meramente formais, têm garantido a aprovação de mudanças institucionais importantes. Para esses autores, um certo pragmatismo das lideranças e uma grande capacidade de negociação têm feito com que o processo decisório não fique paralisado.

No Parlamento, um sistema eleitoral defasado que fragmenta a representação partidária em mais de 20 partidos poderia levar à conclusão de que o processo decisório estaria irremediavelmente comprometido. E que o Executivo não conseguiria aprovar sua agenda mínima, sem a qual o país não seria governável.

A verdade, porém, é que o Poder Executivo tem conseguido construir uma base aliada que tem aprovado sua agenda básica de governabilidade.

Embora nem sempre sejam positivas as consequências da constituição dessa base, não se pode dizer, todavia, que estaríamos diante de um caso de "paralisia decisória". Essa constatação, por outro lado, não nos impede de ver que o nosso processo decisório está bem distante das necessidades do desenvolvimento. Aí entra a questão do sistema eleitoral e seus efeitos.

O formato dos sistemas eleitorais é amplamente reconhecido (Lijphart) como crucial para que (i) os sistemas partidários sejam mais funcionais e democráticos e (ii) os Parlamentos tenham melhor processo decisório e melhor relacionamento com os demais Poderes.

Portanto, para que haja mais funcionalidade no Parlamento brasileiro, um elemento importante a ser revisitado é o nosso sistema eleitoral, na direção do aperfeiçoamento do sistema de representação partidária e da melhor capacidade de resposta do Poder Legislativo.

Muitas vezes, os atores a quem cabe a tarefa de fazer oposição aos governos navegam com dificuldade diante das suas responsabilidades de fiscalização e proposição de alternativas aos projetos dos governos. Nem sempre compreendem a complexidade das nossas instituições e a sua corresponsabilidade pela construção de um modelo mais funcional. No presente, a oposição está praticamente sem projeto alternativo. Confunde o dever de fiscalizar com a quase "obrigação de obstruir". Diante das disfuncionalidades do nosso modelo, acima vistas, tem conseguido frear reformas estratégicas apenas porque foram propostas pelas forças políticas hoje majoritárias.

Basta constatar que a oposição tem obstruído inclusive outras votações importantes para evitar que as reformas tributária e política sejam votadas. Seu impulso a se valer da atual facilidade regimental para obstruir as votações chegou ao ponto de retardar a aprovação da PEC (proposta de emenda constitucional) que modificou o rito das medidas provisórias.

Uma PEC que importa em redução de poderes do Executivo, uma "bandeira" esgrimida pela oposição. Os partidos de situação votaram pela mudança por achar que o fim do trancamento da pauta vai trazer mais equilíbrio nas relações entre Executivo e Legislativo, mesmo com a renúncia de poderes do governo. Outras proposições como essa serão debatidas pelo Congresso Nacional em 2009, a exemplo da reforma tributária, até agora não votada por causa das obstruções da oposição.

Diante de um processo decisório difícil como o presente, espera-se que a oposição não continue a se sentir no "dever de dizer não". Que ela apresente suas posições e assuma uma atitude construtiva. Tanto nas medidas para enfrentar a crise quanto naquelas que melhorem o funcionamento do Parlamento e das outras instituições, passando pela reforma do sistema eleitoral, hoje causador de tantas distorções.

(*) Maurício Rands, 47, advogado, doutor pela Universidade Oxford (Inglaterra), é deputado federal pelo PT-PE. Foi líder do partido na Câmara.

Artigo publicado no jornal Folha de S.Paulo em 11/02/2009.

(fonte: http://melovinicius.blogspot.com/2009/02/o-dever-de-dizer-nao.html)

Comentário: Atualmente, um dos maiores desafios da nossa democracia partidária é justamente o multipartidarismo. Como se pode pôr os interesses da sociedade em primeiro lugar, se em primeiro lugar está os interesses e ideologias do partido? Na verdade não é o multi, mas o supermultipartidarismo que fragmenta a fraca democracia que até hoje não se consolidou totalmente em nosso país. De fato, em nível nacional nossa oposição é fraca, no sentido de que não demontra ter alternativas em relação às posições e decisões do governo, mas demontra ter apenas o dever de dizer "não". Desse modo, são reduzidos ao que se chama "turma do contra": somos contra o que o governo diz, seja benéfico ou não para a sociedade. Já está na hora de dizer basta para os interesses do partido e da ideologia, que se julgam estar acima dos interesses do povo brasileiro. Está na hora de dizer basta para o extremismo existente em nosso sistema político senil.

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